sexta-feira, 28 de maio de 2010

Navegante

De mim
exijam pouco...

Pois o tempo
que me resta
é louca busca
de como atravessar
o Sol...

Damário da Cruz, poeta baiano

domingo, 23 de maio de 2010

Previsão metereológica

Previsão metereológica

Nenhum
dia é triste!
Nós é que chovemos
na hora errada.

Damário da Cruz
In Segredo das Pipas

sexta-feira, 21 de maio de 2010

O último vôo


Li em algum lugar hoje que o poeta baiano Damário da Cruz fez seu último vôo na madrugada dessa sexta feira. Logo ele que fez voar tantas palavras, e até criou um lugar especial para pousá-las, na cidade de Cachoeira, no interior da Bahia. E de lá do Pouso da palavra, meu pai há alguns anos trouxe de presente pra mim um poema-cartaz lindo, que passou a ser um dos meus favoritos e que por muito tempo habitou as paredes de meu quarto. São palavras que conseguem voar com tanta suavidade e que dizem tanto, que certamente não serão esquecidas. E tenho certeza de que esse não foi o último vôo de Damário da Cruz. Apenas mais um vôo dos muitos que ainda virão.

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O Poeta e jornalista Damário da Cruz, morreu na madrugada desta sexta-feira (21) no Hospital Jorge Valente, em Salvador. Ele vinha realizando há meses um tratamento contra câncer de pulmão. Poeta e jornalista, o corpo dele está sendo velado até o meio-dia no Cemitério Jardim da Saudade na capital.

No início da tarde, segue para Cachoeira, cidade em que vivia, onde será velado no prédio da Câmara de Vereadores e, em seguida, sepultado no Cemitério da Piedade. (Fonte: Correio da Bahia)

quarta-feira, 19 de maio de 2010

A canção de Kahunsha


Um livro extremamente triste e doloroso. Perturbador, eu diria, por nos tirar de nosso comodismo e nos transportar para a realidade cruel de tantas crianças, não apenas na Índia, como contado no livro, mas em nosso próprio país. E é angustiante ver crianças cheias de sonhos e esperanças, com os corações puros, serem atropeladas pela vida e pela brutalidade dos homens.
Em A Canção de Kahunsha sofremos ao acompanhar a história de Chamdi, um garoto de 10 anos que vive em um orfanato em Bombaim onde, ainda bebê, foi abandonado pelo pai. Após sobreviver durante anos em condições bem simplórias, o orfanato será fechado e Chamdi decide antes disso fugir e ir em busca de seu pai. E essa esperança de encontrar o pai que o abandonou infelizmente o levará para as ruas violentas de Bombaim, onde a pobreza predomina e as crianças deixam de ser crianças cedo demais.
Um livro de cortar o coração. Não só por nos mostrar sem eufemismos a dura realidade da vida nas ruas em uma cidade que não fica muito distante das nossas, mas por nos sacudir com a esperança e o olhar sempre em busca de sonhos e de coisas belas que um menino consegue manter mesmo diante das maiores dificuldades.

Anosh Irani. A canção de Kahunsha. Ed. Planeta, 2008.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Preciosa


Os livros que conseguem nos transportar para uma outra realidade que felizmente desconhecemos têm o poder de nos sacudir, de nos tirar de nossa zona de conforto. Imaginar que histórias como a de Preciosa são reais é difícil de engolir, porque de tão cruel e por vezes absurda, não queremos verdadeiramente acreditar que sejam possíveis. E o que achei mais bonito foi o livro mostrar que a saída para a vida tão complicada e tão sofrida que essa menina vivia era aprender a ler e a escrever para ter diante de si um mundo infinito de possibilidades e de sonhos. É através de uma escola alternativa e de uma educadora (professor ela teve oportunidade de encontrar vários, mas educador ela só encontrou um, a Srta. Rain) que Preciosa conseguirá finalmente encontrar um apoio, que conseguirá recuperar a sua dignidade. Um livro difícil de ler por conta da linguagem, já que em uma belíssima estratégia de tradução o tradutor optou por manter no texto os erros de grafia da personagem, que no início do livro era analfabeta, dando veracidade ao texto e fazendo a gente mergulhar na história e com isso acompanhar o desenvolvimento da escrita de Preciosa durante o livro. Também é difícil de ler porque tem que ter "estômago" para aguentar certas cenas, mas é um livro bonito porque, ao meu ver, passa uma mensagem de esperança mesmo entre tantos infortúnios que não só Preciosa, como também as outras meninas da história, tiveram que enfrentar. Preciosa é sim uma história muito sofrida, um choque de realidade, mas é também uma história de redenção.

Sapphire. Preciosa. Rio de Janeiro: Record, 2010. Trad. Alves Calado

domingo, 16 de maio de 2010

A Trégua


Um grande amor pode ser uma trégua na vida

Depois de ler "A Trégua" do Mario Benedetti, não consegui ler nenhum outro livro hoje, como pretendia ter feito. Parece que a história ainda estava em mim e nada mais cabia. Tampouco conseguia dizer algo sobre o que li, como se quisesse guardar todas as palavras, todos os sentimentos contidos nesse pequeno livrinho só para mim. Danniel Pennac, em Como um romance, um outro favorito, diz, na página 75, que: "Aquilo que lemos, calamos. O prazer do livro lido, guardamos, quase sempre, no segredo de nosso ciúme. Seja porque não vemos nisso assunto para discussão, seja porque, antes de podermos dizer alguma coisa, precisamos deixar o tempo fazer seu delicioso trabalho de destilação. E este silêncio é a garantia de nossa intimidade. O livro foi lido, mas estamos nele, ainda.Lemos e calamos. Calamos porque lemos". E Pennac tem toda razão. Certos livros despertam em nós tantos sentimentos que, como leitores, temos todo o direito de nos calar, de nada dizer. Permaneço em silêncio, porque o livro ainda está em mim, sendo destilado lentamente. Que ele seja uma pequena "trégua" no meu dia. Mas recomendo esse livro com todas as estrelas, o melhor do Benedetti que eu já li até hoje. Pela sutileza, pela forma delicada com que ele constrói um personagem emocionalmente tão complexo, com que ele traça sua solidão, sua redescoberta do amor depois de tanto tempo. Acho que esse é um livro que não envelhece nunca por falar de sentimentos atemporais que, ao meu ver, fazem parte da vida dos grandes centros urbanos, independente do país ao qual pertençam. Reitero meu encantamento por esse escritor uruguaio que consegue por no papel todas as vozes e todos os silêncios de um coração.

Mario Benedetti. A Trégua. Porto Alegre: L&PM, 2008.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Livros e amigos

"Se a leitura não é um ato de comunicação imediata, é, certamente, um objeto de partilhamento. [...] Aquilo que lemos de mais belo deve-se, quase sempre, a uma pessoa querida. E é a essa mesma pessoa querida que falamos primeiro. Talvez porque, justamente, é próprio do sentimento, como do desejo de ler, preferir. Amar é, pois, fazer dom de nossas preferências àqueles que preferimos. E esses partilhamentos povoam a invisível cidadela de nossa liberdade. Somos habitados por livros e amigos."
Daniel Pennac. Como um romance. L&PM, 2008.

Momo e o senhor do tempo


Às vezes, basta um trechinho de um livro para despertar em nós o desejo de ler. Foi assim com Momo, quando tive a oportunidade de ler um pequeno trecho na minha aula de alemão. E desejando ler a história inteira, saí em busca do livro, feito uma criança. Não me arrependi.
Enganam-se os que talvez estejam torcendo o nariz para o livro se pensam que é um livro apenas para crianças só porque pode ser encontrado na seção de livros juvenis das livrarias. Não é. A história de Momo nos faz pensar sobre o tempo e sobre os tempos modernos de uma forma tão delicada e tão bonita que pode ser muito útil para muitos adultos dos dias de hoje. Felizes as crianças que puderem lê-lo, mas talvez mais felizes sejam os adultos que possam se reencontrar ao ler esse livrinho amarelo.
É um favorito.


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"Existe um mistério muito grande que, no entanto, faz parte do dia-a-dia. Todos os seres humanos participam dele, embora muito poucos reflitam sobre ele. A maioria simplesmente o aceita, sem mais indagações. Esse mistério é o tempo.
Existem calendários e relógios que o medem, mas significam pouco, ou mesmo nada, porque todos nós sabemos que uma hora às vezes parece uma eternidade e, outras vezes, passa como um relâmpago, dependendo do que acontece nessa hora. Tempo é vida. E a vida mora no coração." [pág.53]
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“Es gibt ein groβes und doch ganz alltägliches Geheimnis. Alle Menschen haben daran teil, jeder kennt es, aber die wenigsten denken je darüber nach. Die meisten Leute nehmen es einfach so hin und wundern sich kein bisschen darüber. Dieses Geheimnis ist die Zeit. Es gibt Kalender und Uhren, um sie zu messen, aber das will wenig besagen, den jeder weiβ, dass einem eine einzige Stunde wie eine Ewigkeit vorkommen kann. […] Denn Zeit ist Leben. Und das Leben wohnt im Herzen.”

Michael Ende. Momo e o senhor do tempo. Martins Fontes, 1995.