domingo, 27 de setembro de 2015

A pedra de paciência


"A Pedra de Paciência", de Atiq Rahimi

Em plena guerra no Afeganistão, uma jovem mulher cuida de seu marido, um soldado e herói de guerra que está em uma espécie de coma por conta de um ferimento na nuca durante uma luta. A primeira impressão que temos é a diferença de idade entre os dois, seguida pelo estado de abandono da casa, que parece estar em ruínas. Mãe de duas filhas pequenas, essa jovem mulher se vê totalmente desamparada diante do marido em coma, sob os seus cuidados já que toda a família dele fugiu da guerra, deixando-a para mantê-lo vivo, com duas filhas pequenas para alimentar, e correndo todos os riscos de estar em meio a um bombardeio, principalmente se você for mulher.

É a sensação de desamparo que parece mover a personagem a falar o que sente, o que se lembra, e todos os segredos que silenciou durante mais de dez anos de casamento. O filme, nesse sentido, é um monólogo que descreve toda a opressão das mulheres na sociedade afegã (mas não apenas por lá...). Diariamente voltando para a sua antiga casa para cuidar do marido depois de deixar as filhas aos cuidados de uma tia, que mora em um bordel em uma região mais afastada do centro, a jovem esposa se sente cada vez mais compelida a falar. Histórias desde a sua juventude, quando ficou noiva aos 16 anos do marido, as recordações da sua primeira noite com o marido que revelam como a mulher é objetificada, das cobranças da família para engravidar, o sofrimento da primeira gravidez, entre muitas outras histórias começam a ganhar força e a sensação da personagem é de libertação. Em determinado momento, ela diz para o marido em coma: "em todos esses anos, essa é a primeira vez que você me escuta". Uma afirmação que denuncia toda a opressão sofrida pelas mulheres, que silenciam seus desejos e sonhos, mas também seus segredos, para sobreviver em uma sociedade que não lhes permite ser. Afinal, pode realmente o subalterno falar? É essa a grande reflexão do filme, que demonstra que, mesmo que falem, quase sempre as mulheres não são ouvidas.

"A Pedra de Paciência", de Atiq Rahimi

Mas falar é terapêutico e libertador, e isso a protagonista logo descobre. Mesmo que sem ter certeza de que o marido de fato a estivesse escutando. Narrar essas histórias para o marido é uma forma de curar as suas mágoas e, finalmente, se libertar dos segredos que carregou durante toda a vida. Apesar de ser em grande parte um monólogo, o filme não é nem um pouco monótono. Pelo contrário, seguimos o tempo todo envolvidos nas histórias sofridas e nos solidarizando com ela, mas também compartilhando do despertar dessa personagem para a sua própria vida. Um filme intenso e forte, que discute a opressão feminina e que, sem dúvida, merece ser visto.

Se quiser saber mais um pouco do filme, veja o trailer a seguir:

Um comentário:

Maira disse...

Paula, também amei esse filme quando vi. E tempos depois descobri que havia um livro e que o autor era o diretor do filme, aí não fica dúvida de que o livro deve ser incrível também :)
O que mais gostei foi do autodescobrimento dela, é muito delicado, sutil, mas impregna a gente <3
beijo enorme!